Parabéns, Tuntum!




Doze canções que batem do coração para Tuntum


Emerson Araújo
I

Abro essas doze canções
Que batem do coração
Com voz embargada de infância
Acordes dissonantes
Folha de papel
Branco, seda
Para minha Tuntum, trilha
Uivo, esquina, mar sem ilha.

II

A minha Tuntum, rótulo singular de princesa
Sem castelos
E sem cavaleiros
Nenhum escudo, lança de metal nobre
Nenhuma dama de nenhuma hipótese
Só o velho Riacho a agonizar
Nesses dias secos desse setembro
Nas praças solitárias, galhos quebrantáveis
A minha Tuntum, seus homens imutáveis.

III

A minha Tuntum, outra infância
No fim de tarde, entre chuva serôdia
Na ladainha com profunda tristeza e lágrima
Na partida do ente querido
Na mulher amada com alguidar na fronte
Nos suspiros anônimos, sombras na calçada
A minha Tuntum, buquê com dálias vermelhas
Os galos da noite
Símbolos da noite
Que deixaram de me pertencer.

IV

A minha Tuntum
Seus vizinhos anônimos
A minha Tuntum
Suas sociedades secretas
A dedilhar veredas
Borbulhar passos
Nas olarias noturnas do Mil Réis
Entre luas de toda ordem
Estrelas distantes
Perigos de esquina
A minha Tuntum,
Desdobra-se como criança traquina.

V

A minha Tuntum
E sua finita vontade
De terceira idade
Na Sétima barranca do rio longo que vem do sertão
Olhar de outra sina, seus meninos acima
Traço de horizonte, brejo de cana caiana
Abaixo, a minha Tuntum, rincão que encanta
Extensão de um olhar que anda.

VI

A minha Tuntum, linha tênue
Seus comércios, seus grãos diversos
Ritos de memória
No sino da catedral
No templo sem sino do mover evangélico
Eterna improvisação de suas ruas
Em cálculos imaginários
Nos balcões de madeira nova
No armazém de estiva e varejo do homem da cara feia
Mas de honestidade intocável
A minha Tuntum,
Ruptura profunda do tempo presente.

VII

A minha Tuntum, meu porto possível
A minha infância na vila de barro amarelo
E no açude ausente de cenário envolto
Cinema sem sofá, caneca de emblema familiar
Na velha danceteria que ultrapassou a têmpora
A minha Tuntum, meu horto
Lágrimas para os que partiram
Saudades pelas ausências declaradas
Perdas inominadas na dor dessa canção.

VIII

A minha Tuntum, o meu eixo
Em todas as tardes de domingo
Perfume escorregadio no pescoço
Música cálida no burburinho da vitrola
Dança delicada, passos no salão dominical
Mocinha na espreita, espreita na mocinha
A minha Tuntum, meu feixe
Inocência a carpetar fantasia
A minha Tuntum,
O meu outro trecho.

IX

A minha Tuntum, meu réquiem
Na saudade dos seus mortos
Sem culto, sem címbalos barulhentos
Seus mortos sem condição heróica
Como a velha secretária de sombrinha colorida
E letra viva desenhada nos livros de registro
O padrinho de dente de ouro e tosse sem fim
Que viajou pelas veredas do terceiro horizonte
A prima de face infantil e fala mansa de mosteiro
O ativista cultural, mechas de ouro, Rua São Raimundo
Minha Tuntum,  confirmando os meus mortos.

X

A minha Tuntum, minha praça
Vocação sacerdotal, sofrimento na partida
Bíblica, aconchego na lida
A minha Tuntum, luto e vida, luva e vidro
Seus jardins restritos, a minha Tuntum sem atritos
A minha Tuntum, becos e escondido sertão
A minha Tuntum, abraço de todos, partilha
Trigo, milho novo e certeza do Pão.

XI

A minha Tuntum, som e celebração
Plumas a voar, a minha Tuntum a alardear
A minha Tuntum, quintais e sopros
A minha Tuntum, pulsação e olho
A minha Tuntum, corvo alegre a bisbilhotar
Folhas caídas, a minha Tuntum brecha,
Musical pontuação.

XII

Fecho essas doze canções
Com voz embargada de tempo presente
Tempo ausente
Que nenhum ano trará mais
A minha Tuntum, uma simples selfie
Trêmula no topo dos postes
Estendida nos umbrais das casinhas sem cor
Na torpe saudade, asa de borboleta
Cheiro de alecrim
Na frase substantiva
Do velho cantor.


Feliz 60 Anos, amado Tuntum!
Tuntum 12 de Setembro de 2015