
Tereza Cruvinel/Jornal do Brasil
O que não é sólido sempre derrete. Em apenas três semanas, o presidente Michel Temer viu dissipar-se a promessa de uma guinada positiva em seu governo, a partir da intervenção no Rio, que o levou até a pensar em reeleição. Entrou na mira do Judiciário e viu aliados se evadirem, deixando-o em visível isolamento político ante o risco de uma terceira denúncia. Como ele, seu suposto operador financeiro, o coronel Lima, também teve o sigilo bancário quebrado e aparece na capa da revista Veja desta semana como “a sombra de Temer”. A reviravolta rápida alimenta a especulação de que estaria sendo rifado pelos que o puseram lá. Afastado, seria sucedido por Rodrigo Maia, que concorreria no cargo. Mas o tempo, vale ponderar, é curto para tamanha estripulia, embora o insólito tenha acampado no Brasil.
A intervenção, a escora das Forças Armadas e a criação do ministério da Segurança não chegaram a reduzir sua impopularidade mas trouxeram breve aumento de seu cacife político. Confiante, ele definiu sua iniciativa como “jogada de mestre”. O foguetório aumentou com a divulgação do crescimento de 1% no PIB de 2017, indicando o fim da recessão. Com esta brisa, no mínimo Temer encerraria o mandato como ator influente na sucessão e teria café quente no café no gabinete. Tudo mudou a partir de 2 de março, quando foi incluído no inquérito sobre propinas da Odebrecht para o PMDB, pelo ministro Luiz Fachin, apesar do entendimento anterior do STF, de que o presidente não pode ser investigado no curso do mandato. E piorou no dia 5, com a autorização da quebra de seu sigilo bancário pelo ministro Roberto Barroso, nas investigações sobre o decreto dos portos, embora a procuradora-geral tenha considerado a medida desnecessária. Barroso preferiu a sugestão de um delegado da PF.
No jogo eleitoral, Rodrigo Maia, aliado tão importante no impeachment e na sustentação do governo, lançou-se candidato avisando que não fará a defesa do governo. Onze partidos da base governista marcaram presença na convenção do DEM. Não significa que vão apoiá-lo. Exibem-se no mercado eleitoral valorizando o apoio mas a diáspora é nefasta para Temer. Daqui para frente o apoio parlamentar será mais ralo e caro. Ficou também claro que estes partidos não vão se amarrar a uma candidatura governista sem futuro, como o Planalto chegou a exigir para que continuassem no governo. Com Alckmin e o PSDB, acabou o diálogo.
A centro-direita divide-se entre estes dois candidatos sem voto mas eles parecem ter mais futuro que a candidatura de Meirelles pelo MDB, a que está restando a Temer. O ministro promete se decidir no início de abril, quando teria que deixar o cargo. O MDB oferece a legenda mas não garante a candidatura. Mudou de nome, não de filosofia: se no sistema que temos todo presidente precisará do partido para governar, para quê se desesperar por candidato próprio? De algum modo, o poder virá.
Eleições à parte, as duas bordoadas do STF é que devem tirar o sono de Temer. Não pela quebra de seu sigilo bancário, que ninguém é doido de receber propina na própria conta. O perigo está na devassa da vida dos supostos operadores: o velho amigo José Yunes, com quem ele se encontrou na sexta-feira em São Paulo, o coronel João Baptista Lima Filho, e Rodrigo Rocha Loures, o homem da mala da JBS. Destas investigações podem surgir elementos que convençam Raquel Dodge a pedir o arquivamento dos processos ou a apresentar uma denúncia, que seria o pior dos mundos para Temer. Se os inquéritos se arrastarem, ele seguirá para o final do mandato como não queria: isolado e claudicante, como na surrada metáfora do pato manco.