Dilma pagará conta se salvar Cunha


Presidente perderá argumento para não se contaminar com Lava Jato

KENNEDY ALENCAR 
BRASÍLIA

Se os três deputados do PT que fazem parte do Conselho de Ética votarem a favor do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), a conta será cobrada do Palácio do Planalto. A presidente Dilma Rousseff, que se gaba de que não cometeu desvio ético, terá dado cobertura a um político que sofre graves acusações de corrupção. Dilma perderá o único argumento que invoca para evitar ser contaminada pela Lava Jato.

No entendimento do PT, não dá mais para o partido e o governo ficarem reféns de Cunha porque a chantagem de hoje será substituída por outra amanhã. Seguem dois exemplos. Quem relata a emenda constitucional da recriação da CPMF é um aliado de Cunha, Arthur Lira (PP-AL). Nos bastidores, Cunha sinaliza que poderia trocar o relator se obtiver ajuda do governo. Se Cunha se salvar no Conselho de Ética e houver recurso para o plenário da Câmara, acontecerá outra chantagem para a bancada do PT apoiá-lo. E por aí vai.

Na avaliação do PT, se Cunha aceitar o pedido de impeachment, a iniciativa nasceria manchada pela marca da chantagem e da retaliação. Seria mais fácil vencer uma votação na Câmara. O PT teme que Cunha venha a perder o cargo por ação da Procuradoria Geral da República e do Supremo Tribunal Federal e seja substituído por um presidente da Câmara com mais legitimidade para colocar em votação um pedido de impeachment em meio ao visível agravamento da situação econômica.

Mas o governo teme que a aceitação de um pedido de impeachment agora vire uma bola de neve e Dilma caia. Ora, um governo que acabou de fazer uma reforma que entregou sete ministérios ao PMDB e centenas de cargos a aliados não tem mais condição de administrar o país se não consegue enfrentar uma votação em que precisa alcançar mais do que 171 votos na Câmara.

Na prática, um governo que aceita a chantagem feita por Eduardo Cunha já caiu. Aceitar esse jogo só vai enfraquecer Dilma ainda mais, mas não se deve subestimar a capacidade da presidente de cometer erros.

O adiamento de ontem para hoje da votação da nova meta fiscal foi um sinal de fraqueza do governo. Mas, se o governo conseguir votar a nova meta fiscal hoje, será uma medida importante para enfrentar a crise econômica.

Politicamente, obterá uma vitória pontual, porque evita que a presidente Dilma Rousseff seja acusada de desrespeitar a Lei de Responsabilidade Fiscal, o que poderia servir de justificativa para um eventual impeachment.

Se o governo não conseguir votar a nova meta fiscal, adicionará mais problemas à economia, porque serviços públicos importantes poderão ser paralisados. E criará mais dificuldades políticas, vitaminando a tese de impeachment.

O governo diz que está preparando medidas de incentivo à economia, mas que deverá apresentá-las somente no ano que vem. Por que no ano que vem se a vaca está indo para o brejo agora?

A presidente Dilma sempre demora a agir. Quando age, muitas vezes age errado. Noutras, mais raras, atua corretamente, mas o atraso tira parte do efeito positivo.

O governo Dilma está caminhando para ter um dos piores desempenhos econômicos da história do país. É óbvio que a presidente deveria ter procurado conversar com setores da oposição em torno de uma agenda mínima quando tinha mais força política. Deveria fazê-lo até no atual momento de fraqueza.

A oposição deveria ter mais responsabilidade, porque poderá administrar um país destruído daqui a três anos. Essa destruição significa menos emprego e renda na vida real das pessoas. Pior: poderá herdar um país eivado pelo ódio político. Quem perdeu hoje vai querer se vingar amanhã.

Mas Dilma está mais preocupada em aceitar ou não chantagem de Eduardo Cunha. A oposição se comporta como se não tivesse responsabilidade com os destinos econômicos e políticos do país. Conclusão: tudo indica que as coisas continuarão a piorar na política e na economia, prejudicando a vida dos brasileiros.