“Os comunistas venceram”

O Maranhão acorda e elege Flávio Dino. Manoel da Conceição vibra.

Por Maurício Dias/CartaCapital

Flávio Dino

Dentro de poucos dias, o Brasil dará um passo em direção à modernidade do Maranhão, hoje um estado nordestino em decadência. Os maranhenses estão prestes a perder a condição de súditos de uma oligarquia para se tornarem cidadãos de uma unidade federativa de fato. Pouco ou muito? Na prática, isso significará o fim da dinastia comandada por José Sarney, que, favorecido por fatalidade, no caso a morte de Tancredo Neves, tornou-se o 20º presidente do Brasil entre 1985 e 1990, por eleição indireta.

Demorou essa mudança de status do Maranhão. Uma demora angustiante, mas absolutamente normal em um país onde quase tudo ocorre em movimentos lentos, sem transformações bruscas. A história do Brasil, como anotou, insatisfeito, o jornalista republicano Silva Jardim (1860-1891), “parece puxada a charrete”.

No dia 5 de outubro, a charrete avançou um pouco mais rápido. O ex-juiz federal, ex-deputado federal e professor universitário Flávio Dino, também filiado ao PCdoB e filho de um ex-deputado cassado pela ditadura, acusado de ser comunista, pôde finalmente, abraçado ao pai e ao histórico líder camponês Manoel da Conceição, também vítima do regime militar, comemora: “Os comunistas venceram”.

Não se assuste, pessoal! Isso foi tão somente uma boa ironia dos vencedores com os adeptos de um mundo que ruiu. Tardou, mas aconteceu.

Aos 92 anos de vida, o PCdoB elegeu o seu primeiro governador, derrubando uma oligarquia quase cinquentenária. Mas ela mantém intactos alguns tentáculos poderosos. Ela domina, por exemplo, quase todo o sistema de comunicação do estado. Os Sarney, nesse capítulo, cederam um pouco aos aliados. A família Lobão é um deles. Representada no poder por Edison Lobão, ministro de Minas e Energia de Dilma, e o filho dele, alcunhado Lobinho, que, apoiado oficialmente pelo PT, perdeu a disputa para o governo estadual. Governava então Roseana Sarney.

Pouco antes da eleição, entrevistado pela tevê local, a Mirante, afiliada da Globo, Flávio Dino foi surpreendido com a pergunta inusitada do entrevistador: “Se vencer, o senhor vai implantar o comunismo no Maranhão?”

Em resposta à provocação, Dino prometeu implantar a democracia e mudar os porcentuais hediondos dos indicadores sociais alimentados pelo descaso dos governos dos últimos 50 anos. Ou seja, a família Sarney essencialmente.

Eis alguns exemplos: o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) está emparelhado com o Brasil... de 1980. Lá está a segunda pior expectativa de vida do País e, também, o segundo maior índice de mortalidade infantil. Esse é um pequeno retrato do flagelo ao qual o IBGE acrescentou, na terça-feira, 16, mais um dado: o Maranhão tem menos da metade da população com alimentação garantida.

O feito de Flávio Dino e aliados “não foi algo simples ou fácil e até desafiou a lógica política de um estado marcado pelo patrimonialismo que sustenta o poder familiar de José Sarney desde 1965”, anota o governador eleito.

A esperança não tinha morrido. Adormecia. Despertou então desse longo pesadelo. Os maranhenses, por quase 64% dos votos, “proclamaram a República”. É outra forma usada por Dino para comemorar a vitória, ocorrida numa das mais pobres regiões do País.

A vitória foi construída, segundo o governador eleito, e um terreno no qual “eram visíveis as rachaduras no bloco oligárquico, que teve dificuldades em definir o projeto e sentiu o peso da rejeição popular”.

O sentimento antioligárquico, manifestado em vários momentos no Maranhão, ampliou-se. A história dessa disputa é muito mais longa e variada. De qualquer forma, mesmo em algumas linhas, o desfecho será igual ao de um relato mais longo. O final feliz.