O pesquisador Carlos Leonardo entrevistado do Jornal Pequeno |
O pesquisador, mestre e doutorando em gestão de saúde primária tuntunense Carlos Leonardo Figueiredo Cunha foi entrevistado na edição, deste último domingo(08), do Jornal Pequeno/São Luís onde falou sobre o estudo crítico “Construção de hospitais de pequeno porte como política de saúde: um caso emblemático no estado do Maranhão, Brasil”?
Carlos Leonardo Cunha tem um currículo invejável em diversas áreas da saúde como pesquisador e articulista de diversos artigos em publicações brasileiras e internacionais, sendo considerado pelo seus pares como um dos maiores técnicos em Política e Gestão em Saúde e Atenção Primária.
O Currículo
Carlos Leonardo Figueiredo Cunha, possui graduação em Enfermagem e Obstetrícia pela Universidade Estadual do Maranhão (2003). Especialização em Saúde da Família, Formação Pedagógica e Planejamento, Programação e Políticas de Saúde. Mestrado em Saúde Materno Infantil pela Universidade Federal do Maranhão (2010). Foi Docente dos Cursos de Enfermagem da Universidade Estadual do Maranhão (UEMA), Faculdade Santa Teresinha (CEST) e Universidade Federal do Maranhão (UFMA). Atualmente é Doutorando em Saúde Coletiva pelo Instituto de Estudos em Saúde Coletiva (IESC/ UFRJ). Avaliador externo do Programa QualiSUS- Redes de Atenção do Ministério da Saúde e Pesquisador do Grupo de Pesquisa e Documentação do Empresariamento da Saúde no Brasil (GPDES/ IESC/UFRJ).
Possui artigos publicados em revistas de impacto nacional e internacional. Editor do Journal of Management and Primary Health Care (JMPHC). Consultor Ad Hoc da Revista Gestão e Saúde (UnB) e Cadernos de Saúde Coletiva (UFRJ) e Membro do Corpo Editorial da Revista de Políticas Púbicas - SANARE. Tem experiência na área de Saúde Coletiva, com ênfase em Política e Gestão em Saúde e Atenção Primária.
A entrevista
1) Jornal Pequeno - O que lhe levou a realizar um ensaio crítico intitulado “Construção de hospitais de pequeno porte como política de saúde: um caso emblemático no estado do Maranhão, Brasil”?
Sou maranhense, obtive toda a minha formação em universidades públicas no Maranhão e me sinto na obrigação de dar um retorno ao meu estado. Atualmente transito em grandes centros de pesquisas, instituições de ensino e no Ministério da Saúde e me inquieta muito a visibilidade negativa da saúde do Maranhão nessas instâncias. Trabalhei como profissional, exerci a gestão, lecionei em três grandes universidades locais, fiz parte do grupo da pesquisa “Situação de Saúde no estado do Maranhão”, na qual a minha dissertação de mestrado foi oriunda, entre outros estudos e considero que tenho propriedade e conhecimento da realidade local para critica-la e questioná-la.
2) Jornal Pequeno - Qual o impacto para construção de Hospitais de Pequeno Porte no Maranhão?
A construção de hospitais de pequeno porte no Maranhão não seguiu as diretrizes da regionalização dos serviços de saúde, ou seja, não foram levados em conta critérios mínimos da gestão e economia da saúde, como economia de escala e escopo, além de critérios epidemiológicos, rede de serviços e racionalidade de recursos humanos. Considero que esta política não possui sustentabilidade, pois os municípios são de pequeno porte, arrecadam poucos impostos e possuem poucos recursos para manter gastos com recursos materiais e humanos desses hospitais. O Maranhão é o estado brasileiro com o menor percentual de médicos por habitantes e de especialistas e a aumento de leitos hospitalares de forma irracional não terá impacto na redução da mortalidade infantil e consequentemente do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do nosso estado, que diga-se de passagem ainda é um dos piores do País. O estado do Maranhão tem enormes desafios no que concerne à situação de saúde. Apesar de possuir uma alta cobertura nominal da Estratégia Saúde da Família (80,5 %), muitas das atividades básicas previstas para a melhoria da saúde não são realizadas, sugerindo que os esforços para a organização de sistemas locais e regionais de saúde devem se concentrar na qualificação dos serviços existentes e reforço das referências regionais. As propostas apresentadas para a construção de unidades hospitalares de pequeno porte em cidades situadas no estado do Maranhão não são adequadas à organização de sistemas hierarquizados e regionalizados de saúde e ao volume e critérios de financiamento para sua sustentabilidade.
3) Jornal Pequeno - O que você achou da escolha do secretário estadual de saúde, Dr. Marcus Pacheco, na gestão do Governador Flávio Dino?
Bem, já trabalhei com o Professor Marcos Pacheco em curso de qualificação de gestores do SUS do Maranhão. Foi um curso realizado pela FIOCRUZ em parceria com o Departamento de Saúde Pública da Universidade Federal do Maranhão. Ele possui um perfil interessante, é médico e advogado de formação e possui mestrado e doutorado em Políticas Públicas. Já exerceu cargos de gestão em âmbito municipal e além de tudo possui uma trajetória política. Porém, sabemos que o Maranhão é um estado com uma extensão territorial muito grande, caracterizado por diferenças e subjetividades nas gestões em âmbito municipal. O papel da gestão municipal será de suma importância para melhoria dos indicadores de saúde e organização dos serviços no nosso estado. Além do mais, acredito que o quadro de funcionários da Secretaria Estadual de Saúde tem que ser ampliado, de forma quantitativa e qualitativa. Para se ter uma ideia, há décadas não ocorre certames para a área da saúde no governo estadual.
4) Jornal Pequeno - Como você avalia a proposta de priorização e valorização da atenção básica na próxima gestão?
A Atenção Básica à Saúde, foi coadjuvante na atual gestão estadual. Apesar da alta cobertura em nosso estado, através da Estratégia Saúde da Família (80% de cobertura), qualitativamente é muito incipiente. Os hospitais continuam com leitos e corredores ocupados por pacientes vitimados por doenças que poderiam ser evitadas e controladas por uma atenção básica resolutiva, o que aumenta mais ainda os gastos com a saúde, de forma errônea e irracional. Para (re) construção, sugiro uma repactuação com os gestores municipais , afim de estruturar os serviços com as seguintes dimensões: porta de entrada preferencial à rede ( reavaliar horários e turnos de atendimento, o próprio atendimento, acesso à consultas, ofertas de ações pela equipe de saúde da família); acesso a serviços de saúde especializadas, no que tange a consultas e exames ( agendamento para serviços especializados, tempo estimado de espera para serviços especializados, acesso a serviços específicos, monitoramento das listas de espera). Porém, para que isto aconteça se faz necessário vontade política, com a priorização do cofinanciamento da rede de atenção básica dos municípios pela gestão estadual, revisão da estrutura de trabalho, dos vínculos empregatícios e investindo na continua formação dos profissionais de saúde e dos gestores. Se a proposta é que a atenção básica seja coordenadora dos cuidados e ordenadora das Redes de Atenção à Saúde, deve estar integrada à rede de serviços, ordenando fluxos e garantido o acesso a serviços especializados conforme necessidade, contribuindo para a redução da fragmentação, duplicação de ações e intervenções desnecessárias. Temos um sistema público universal estabelecido por Lei, o que diferencia a realidade e qualidade deste mesmo sistema nos estados e municípios no Brasil é o compromisso, preparo e vontade política da gestão que a ela administra.
5) Jornal Pequeno - Como a regionalização dos serviços de saúde pode contribuir para o processo de redução das desigualdades no estado do Maranhão?
A regionalização de forma induzida pode ser um instrumento poderoso para efetiva democratização do acesso a políticas públicas no Maranhão. De início, sugiro realizar um estudo com o objetivo de realizar uma mensuração prévia e identificar regiões com “grandes densidades" “e regiões com “baixas densidades”, de equipamentos públicos de todos os tipos, desde equipamentos urbanos básicos (como iluminação, redes de abastecimento de água, sistema de esgoto e coleta de lixo), até fixos geográficos públicos como hospitais, universidades, escolas, creches, delegais, defensorias públicas etc). Através deste estudo, é possível definir uma matriz de escassez regional, que deve guiar a melhoria de certos equipamentos e/ ou construção de outras áreas de menor densidade de existência, induzindo a integração de diversas políticas setoriais, resultando. Resultar-se-á na integração de diversos campos da atenção à saúde e de políticas econômicas e sociais voltadas para o desenvolvimento e redução das desigualdades regionais. Para isso, sugiro a necessidade da a criação de “regiões administrativas”, para o melhor funcionamento de todas as das políticas públicas que se voltem a contribuição no processo de redução das desigualdades no estado do Maranhão (do poder executivo, judiciário, previdência social, políticas industriais, ambientais, de saúde, entre tantas outras).
6) Jornal Pequeno - Você poderia sugerir algumas ações para a futura gestão estadual de saúde.
Primeiramente, sugiro a organização de uma equipe de transição, formadas por técnicos e consultores em saúde com conhecimento da realidade maranhense e dos parâmetros nacionais vigentes. Revisitar e consultar o plano estadual de saúde vigente e realizar o planejamento dos próximos anos, tendo como base este instrumento. Conhecer outras realidades e experiências exitosas em âmbito estadual e regional. Contratação de consultores. Criação de Centrais de Regulação, para controlar a disponibilidade de leitos e a marcação de consultas e exames nas unidades municipais, estaduais e federais. Dotar as regiões de saúde de uma policlínica regional para atendimento de média complexidade. Avaliar a necessidade de construção de hospitais de alta complexidade nas cidades de Imperatriz, Caxias e Pinheiro. Criar uma Unidade de Gestão de Projetos (UGP) dentro da Secretaria Estadual de Saúde para acompanhar a execução dos projetos no âmbito estadual. Incentivo e investimento na criação de consórcios intermunicipais para reduzir os custos e ampliar o atendimento de forma mais inteligente, organizando a demanda. Criação da Escola de Saúde Pública do estado do Maranhão, para qualificação de gestores e aperfeiçoamento de profissionais da área de saúde alinhada aos anseios do SUS. Realização de concurso público para profissionais de saúde, com um plano de carreira que incentive o trabalhador e dê condições de trabalho, estrutura de formação e segurança na aposentadoria, assegurando a fixação desses profissionais em todos os municípios maranhenses. Aprovação do Projeto de Lei que estabelece a jornada de 30 semanais para os profissionais de enfermagem.
Fonte: Jornal Pequeno