Do Jornal do Brasil

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Hoje, amanhecemos em um dos dias mais tristes do Brasil. A prisão de um ex-presidente da República, fato que não encontra similar em qualquer página de nossa História, mesmo nos momentos de conturbação intestina. Dia triste, independentemente de termos ou não simpatia por esse metalúrgico pernambucano, que chegou à alta magistratura do país, e, estando lá, deixou contribuição para nossa projeção no exterior. Triste, mais ainda, pelo fato de que, antes de se tratar de um presidente, foi um cidadão condenado, por crimes que sempre negou, sem que os tribunais lhe dessem a oportunidade de ir às últimas instâncias para defender-se. Nisso a Constituição também sai machucada. Ora, se esse é um direito que lhe é negado, por obra de filigranas jurídicas, imaginemos o que pode ocorrer com qualquer outra pessoa alvejada pelo martelo de um juiz na segunda fase de julgamento. 

Presidentes houve que tiveram de enfrentar quadras de doloroso constrangimento. Alguns apeados do poder por força de armas; outros, sob pressão político-partidária ou reféns, sem que tenham faltado aqueles que caíram, por não cederem a interesses inconfessáveis. Vargas, protagonista da tragédia maior, decretou sua própria morte. Mas nenhum preso, o que fez desta sexta-feira um dia melancólico, tanto para qualquer um de nós, que amanhecemos com ele, mas, se a História tem alma, também para ela, que haverá de dobrar essa página com imenso pesar. Ela, talvez mais ainda, porque estará guardando para o futuro uma sentença prolatada quando o julgamento ainda caminha, à procura de provas, não circunstanciais, mas consistentes. Lula está no centro dessa tragédia, cujo lance mais chocante, com sinais de exagero, foi a fixação da hora para se apresentar ao carcereiro. 

Neste mesmo espaço, cedendo a compromissos que supõe inarredáveis, este jornal levantou-se para afirmar que Lula precisava, como ainda precisa, ser tomado na conta de vítima privilegiada de uma estrutura política que se deixou dominar por vícios que, de tão poderosos, são capazes de ditar ao presidente concessões ou arbítrios que ele, em sã consciência, não toleraria. A reflexão ainda faz sentido hoje, porque a estrutura asfixiante sobrevive e vai sobreviver. Além do mais, é permitido denunciar que falta alguém no banco dos réus em que Lula se sentou. Quem? Os patriarcas das oligarquias que se elegem e se reelegem infinitamente, e na prática desse crime são capazes de fazer tanto, ou mais, do que se atribui ao ex-presidente. O juiz Moro devia dar assento nesse banco aos que armam esquemas milionários para fazer a estreia de seus filhos e dos cônjuges na política, sem faltar espaço para os amigos do poder, que descobrem em pizzaria malas de muitos milhares de dólares. E os senadores, que se subornam, mas afirmam que se trata apenas de empréstimo pessoal e amigável. Em que celas o douro Moro mandaria que se hospedem os autores desse velhaco fundo partidário, onde vão beber os sedentos de sempre? Lula, solitário, por ser acusado de receber, de prêmio, um tríplex, o que é grave, mas depende de comprovação. E os que serviam fielmente a governos anteriores e hoje têm trânsito livre no gabinete presidencial, ou quem, ironicamente ministro da Justiça na gestão Fernando Henrique, pratica, à vista de todos, acrobacia entre as dezenas de processo em que se indiciou. 

O mundo desaba nas costas do metalúrgico, sob o olhar indiferente de gente impune. Que dia triste!