Eles não ligam para a constituição, e, agora, a estão substituindo, de forma espúria, por emenda, rejeitada por maioria da população, para a construção de um estado neo-liberal que a contraria visceralmente.
Há pouco celebrei um casamento, um dos mais bonitos que já tive o privilégio de realizar, na região leste da cidade de São Paulo, ao som negro da periferia… Lindo!
Em determinado momento, uma das músicas executadas foi a que Michael Jackson gravou, acompanhado pelos tambores negros do Oludum, em várias cenas da pobreza brasileira, chamada They don’t care about us, ou como foi traduzido no clip original: Eles não ligam pra gente.
Nessa música se faz uma crítica ao Estado alheio aos empobrecidos, que governa amparado pelas forças de repressão, no clipe, personificadas pela Polícia Militar.
Ao ouvir a música incomum para ambiente de casamento, me dei conta de que por meio desta e de outras músicas, que foram executadas, o casal falava de sua indignação com o descaso para com os empobrecidos, para com os despossuídos, e fiquei impressionado com a consciência e o protesto desses jovens cristãos frente ao desgoverno que se abate sobre a nação, em momento de tanto significado para as suas vidas.
E é verdade… Eles não ligam para o bem comum, e deram um golpe de estado, para frear as investigações que, certamente, se levadas a sério e a cabo os deteria e os incriminaria por corrupção, por dilapidação do patrimônio público.
É verdade… Eles não ligam para os trabalhadores e vão, lançando mão de eufemismo, flexibilizar os seus direitos.
É verdade… Eles não ligam para os necessitados, e ganharam as eleições com candidatos, em grande parte, totalmente alheios ao povo sofrido que tem de enfrentar a cidade em transportes públicos lotados e inadequados para a demanda, para garantir o lucro, via mais valia, dos donos do capital.
É verdade… Eles não ligam para a educação nem para os estudantes, os tratam como se bandidos fossem, e estão pondo fim a todos os programas que promovem a inclusão e a ascensão, via educação, dos jovens da classe empobrecida, e propondo uma reforma educacional à revelia dos mais interessados, os discentes, assim, como estão a propor uma escola onde o debate de idéias não só esteja proibido, como as matérias que promovem a reflexão crítica sejam alijadas da grade curricular.
É verdade… Eles não ligam para as mulheres, fazendo chistes grosseiros sobre a procriação das empobrecidas, em estado de subalternidade, e, agora, governam as cidades, em sua maioria femininas, onde a cultura do estupro é menosprezada.
É verdade… Os empobrecidos lhes provocam ânsias, e eles, agora, governam cidade que esconde os empobrecidos na periferia invisível, para que a cidade mantenha uma fama de modernidade a que, há muito, não faz mais jus.
É verdade… Eles não ligam para a justiça e são saudados por pastor ensandecido que, negando o Cristo, os saúda como resposta do Deus que, já faz tempo, não cruza mais os ares do país no mesmo voo que o referido clérigo.
É verdade… Eles não ligam para nós, eles não tem o mínimo senso de decência e, assim, cooptaram quem nos deveria informar, para mentir e manipular dados, para que a verdade desaparecesse de nosso horizonte, e como disse outro artista, nos sobrasse apenas o que ele chamou de “vida de gado, povo marcado”.
É verdade… Eles não ligam para os negros, maioria da população do país, fazem vista grossa ao genocídio da juventude negra, e querem acabar com a negritude brasileira como elemento denotativo da cultura nacional.
Esse casamento, com maioria de presença de negros, aconteceu na mesma região onde 5 jovens negros, depois de serem interpelados por policiais, segundo mensagem que mandou um deles, simplesmente, desapareceram.
É verdade… Eles não ligam para a constituição, e, agora, a estão substituindo, de forma espúria, por emenda, rejeitada por maioria da população, para a construção de um estado neo-liberal que a contraria visceralmente.
É verdade… Eles não ligam para a lei, e os que deveriam zelar pela legalidade negam o direito à greve aos servidores públicos, e dizem que, se a intenção for boa, a exceção vale, e a prova pode ser coletada ao arrepio da lei, aliás, dizem que em certos casos, e com referência a certas pessoas, a prova é um luxo descartável, e, assim, a materialidade do crime foi levada à categoria de supérfluo. E, para eles, boa intenção é tudo que promova o aprofundamento do golpe e do poder discricionário dos que, em nome da ilegitimidade, protegem os culpados, sustentando-os no poder.
É verdade… Eles não ligam pra gente, e se não reagirmos à altura, essa história vai terminar como termina o clip: com um grito de horror!
Nosso luto vem do verbo lutar!
Blog Nocaute