“… assim como o Senhor vos perdoou, assim também perdoai vós” (Cl 3.13)
O perdão é uma decisão difícil de se tomar. Talvez, a mais desafiadora da vida. Entretanto, a mais necessária. Perdão é recusar manter os registros negativos do próximo. É apagar da memória os agravos recebidos. É zerar a conta do devedor, mesmo quando o saldo negativo é assaz vultoso. É atenuar a culpa do desafeto e depois apagá-la. Por isso, o perdão é um ato de misericórdia e não uma reivindicação de justiça. É tratar o próximo como Deus nos trata. É perdoar como Deus nos perdoa.
A ausência de perdão torna a vida um flagelo e coloca a alma num cárcere. Guardar mágoa é cobrir a mente de fuligem e o coração de insuportável amargor. Sendo assim, perdoar é uma necessidade de sobrevivência. Por não sermos perfeitos nem convivermos com pessoas perfeitas, teremos queixas uns dos outros. As pessoas nos decepcionam e nós decepcionamos as pessoas. Elas nos ferem e nós as ferimos. Elas nos magoam e nós as magoamos. Onde falta perdão, portanto, o ambiente torna-se pesado, os sentimentos ficam esgarçados e a alma adoecida. Quem não perdoa fecha a porta da graça com suas próprias mãos, pois quem não perdoa não pode ser perdoado. Quem não perdoa interrompe sua comunhão com Deus, a fonte da vida, pois a mágoa interrompe as orações e cerra sobre nossa cabeça as janelas do céu. A ausência de perdão nos priva do maior dos privilégios, adorar a Deus. A falta de perdão adoece o corpo, atormenta a mente e desassossega a alma.
Perdoar não é uma opção, mas um imperativo. Não é uma escolha, mas um dever. Mas até quando perdoar? Até sete vezes? Não, até setenta vezes sete! O perdão é ilimitado. Onde há arrependimento, aí o perdão deve se estabelecer. Onde há quebrantamento, aí o perdão oferece cura. Onde há choro, aí o perdão traz alegria. O perdão é o remédio para as feridas da alma, o bálsamo para os traumas da vida, a assepsia para a infecção generalizada da mágoa.
O perdão não é natural. É uma expressão da graça. A não ser que o próprio Deus nos capacite, reteremos a mágoa e não liberaremos o perdão. A não ser que o óleo terapêutico do Espírito umedeça o nosso coração, ele se tornará cada vez mais duro e insensível. A não ser que Deus aumente nossa fé, crescerá ainda mais dentro de nós a erva daninha do ressentimento e nossa vida tornar-se-á um campo de urtigas e espinheiros.
A mágoa não é apenas o resultado inglório da insensatez do próximo contra nós, mas nossa reação negativa e perversa diante do que nos foi feito. Quando alimentamos ranço no coração, tornamo-nos iguais àqueles que nos feriram. Pagamos a eles com a mesma moeda. Em vez de vencermos o mal com o bem, somos duplamente derrotados pelo mal. A mágoa é assaz perigosa, pois em vez de estancarmos a hemorragia provocada pelas feridas que nos foram desferidas, abrimos novas feridas em nós e nos outros. Em vez de construirmos pontes de reconciliação, cavamos mais abismos de separação. Em vez de imitarmos a Jesus, que perdoou seus algozes, calçamos as sandálias do próprio acusador, e desferimos contra o próximo, golpes ainda mais violentos.
O perdão é o caminho da cura e o remédio eficaz para uma alma ferida pelo ódio. O perdão é maior do que ódio. O perdão suplanta o ódio. O perdão triunfa sobre o ódio. O perdão tira a alma do calabouço da mágoa. Arranca o coração da prisão insalubre dos ressentimento e promove a liberdade de amar quem não merece ser amado. O perdão nos torna parecidos com Deus, a fonte do amor e o exemplo superlativo da compaixão. O perdão nos coloca num relacionamento certo com Deus, com o próximo e com nós mesmos. O perdão é a assepsia da alma, a cura da mente, a alforria do coração!