Entrevista: "Quem divide o Brasil entre nós e eles é o PSDB”, diz Pimentel

Eleito governador de Minas Gerais no primeiro turno, o ex-ministro critica o "desprezo" dos tucanos por nordestinos e pobres

por Sergio Lirio/CartaCapital


CartaCapital: O senhor venceu no primeiro turno em Minas Gerais, governada há 12 anos por Aécio Neves e seu grupo político. O que explica essa vitória?

Fernando Pimentel: Fizemos uma campanha focada no interior das fronteiras de Minas Gerais. Talvez pela primeira vez nos últimos anos de fato houve uma discussão sobre o estado. Percorremos todas as regiões, ouvimos o que os mineiros queriam dizer. E observamos um fato: ao contrário da propaganda do governo tucano, a vida dos cidadãos não melhorou, o estado não enfrentou os problemas principais. A sensação de bem estar deve-se em grande medida às iniciativas do governo federal e ao fato de o Brasil ter experimentado uma fase de crescimento.

CC: Como os mineiros interpretavam os dois conceitos centrais da administração do estado, o choque de gestão e o governo voltado para as pessoas?

FP: Essa história do choque de gestão foi vendida para uma camada da população, da classe média para cima. Para o povo trabalhador, não diz nada. O que era claro para eles: o fato de a segurança pública estar muito ruim, não ter esgoto, biblioteca, de o posto de saúde não atender por falta de profissionais. Foi o Mais Médico, programa do governo Dilma, que levou agentes de saúde a várias regiões mineiras. Há um certo tempo de maturação das coisas. Como diz o ditado, você pode enganar alguns o tempo todo, todos por algum tempo, agora todos o tempo todo você não engana, não. O modelo do PSDB em Minas era muito baseado nessa mistificação de gestão competente, desmentida pela prática. E essa realidade a nossa campanha conseguiu desnudar.

CC: No debate da terça-feira 14 na Band, Dilma Rousseff afirmou que Aécio Neves, quando governador de Minas, não cumpriu os limites constitucionais de investimentos em saúde e educação. Ele classificou de mentira a declaração. Imagino que o senhor tenha estudado os números da administração estadual. Qual a realidade?

FP: Ele não cumpriu mesmo. Tanto não cumpriu que ao fim do mandato foi obrigado a assinar um termo de ajustamento de gestão no qual se comprometia a partir de certa data a cumprir os investimentos na saúde e na educação. Ele diz que as contas dele foram aprovadas. Sim, foram aprovadas, mas só depois de assinar o termo de ajustamento com o Ministério Público. O sucessor do Aécio, o Antonio Anastasia, comprometeu-se a cumprir na íntegra, mas o prazo começa a contar no próximo ano. Ou seja, serei o primeiro governador em mais de uma década a cumprir os mínimos investimentos exigidos pela Constituição nestas duas áreas. Digo mais: Minas Gerais só não piorou porque o Brasil estava mergulhado em uma fase de prosperidade proporcionada pelo governo Lula. A economia brasileira enfrenta dificuldades de um ano e meio para cá, mas a diferença é que não houve perda de empregos e renda dos trabalhadores e da população mais carente.

CC: Agora eleito, de que maneira o senhor pretende apoiar a campanha de Dilma Rousseff em Minas Gerais?

FP: No sábado, o Lula estará em Belo Horizonte. Só ele, sem a Dilma. Ele cumpre uma agenda em separado para multiplicar o alcance do radar e estamos aqui em busca de um local para reunir no mínimo 5 mil mineiros. Trabalhamos com toda a força contra o grande investimento dos tucanos aqui. Eles despejam uma montanha de dinheiro na campanha no estado. Virou um ponto de honra para o Aécio vencer aqui. Em setembro, depois de se descuidar da campanha estadual, Aécio disse de forma arrogante: “Voltei para Minas e vou fazer barba, cabelo e bigode”. Não fez nem barba nem cabelo. Ganhei no primeiro turno e a presidenta Dilma teve mais votos aqui do que ele. Se bobear, neste segundo turno, ele não faz nem o bigode. Disse o tempo todo na minha campanha: em Minas não tem rei, soberano ou imperador. Quem manda é o povo. O resultado do primeiro turno me deu razão.

CC: Dizem que o senhor é contra a linha de ataques a concorrentes e defensor de uma espécie de mea culpa no caso Petrobrás. É isso mesmo?

FP: Não. Nunca tive esse tipo de conversa com ninguém da campanha da presidenta, muito menos com ela. Nunca opinei sobre assunto. Sempre defendi a ideia de uma campanha propositiva, mas isso não significa que a crítica não deva ser feita. Ela é necessária. Considero que a campanha da Dilma acerta no tom, não vejo exagero nas críticas. Acredito, porém, que o eixo da campanha não deveria ser a comparação entre a gestão federal e o governo de Minas Gerais. Para a maioria dos eleitores de fora do estado, o efeito é pequeno.

CC: Qual deveria ser a disputa?

FP: São dois projetos diferentes para o País. Para que serve o governo? Qual o objetivo do Estado em um país como o Brasil? O nosso projeto é claríssimo. O debate entre o Guido Mantega e o Armínio Fraga deixou isso muito claro. O nosso modelo é diametralmente oposto ao deles. Temos um projeto e uma proposta de governo para melhorar a vida da maioria, garantir emprego, renda, defender a nossa indústria. O eixo da proposta dos tucanos é melhorar as condições para a rentabilidade, principalmente do capital financeiro, dos investidores, acionistas das empresas com ações nas Bolsas de Valores. Toda a preocupação é em lustrar a nossa imagem econômica para proporcionar melhores ganhos para quem não precise trabalhar para viver. Nós estamos preocupados com quem trabalha para viver, 90% da população brasileira.

CC: Os tucanos acusam o PT de apostar no “nós contra eles” e dividir o Brasil.

FP: Quem aposta no “nós contra eles” é o PSDB. O lema do governo Lula era um Brasil para Todos. Com a inclusão social, a melhora da renda dos trabalhadores e o aumento do emprego, todos ganharam. Pobres e ricos. O espírito sempre foi esse, da inclusão, não da exclusão. Quem despreza os eleitores nordestinos? Quem promove ataques nas redes sociais contra o Nordeste? Quem tenta intimidar o eleitor que pensa o contrário? O Fernando Henrique Cardoso disse ou não disse que quem vota na Dilma e no PT são os pobres e desinformados? Os tucanos dividem o Brasil de uma maneira muito preconceituosa, desrespeitosa. Como se existissem cidadãos de segunda classe contra os sábios que conhecem o melhor caminho. Mas penso o contrário. Confio na maturidade e na consciência política dos brasileiros.